segunda-feira, novembro 27, 2006


Revisão do ECD termina sem acordo dos sindicatos
Marta Rangel 2006-11-21

O processo de revisão do Estatuto da Carreira Docente terminou ontem sem o acordo dos sindicatos. No entanto, o secretário de Estado adjunto da Educação avaliou "positivamente" o processo de negociação.
Perante a ausência de acordo na revisão do polémico Estatuto da Carreira Docente (ECD), os sindicatos prometem novas formas de luta, em particular com acções para verificar a constitucionalidade do diploma apresentado pelo Ministério da Educação. Segundo José Nóbrega Ascenso, secretário-geral do Sindicato Nacional dos Profissionais de Educação (SINAPE), em declarações à agência Lusa, "não há condições para haver acordo global, nem parcelar, apesar de, nas questões secundárias, terem existido aproximações importantes. Essas aproximações não se verificaram ao nível do que é essencial, como as duas carreiras, as quotas e as vagas".Na segunda reunião da negociação suplementar, o Ministério da Educação (ME) reviu os requisitos para o concurso à categoria de professor titular - a mais elevada das duas que a tutela pretende criar - facilitando as candidaturas dos docentes que se encontram, actualmente, nos últimos escalões da carreira. Os professores do 8.º, 9.º e 10.º escalões vão poder concorrer, mesmo que não tenham dado aulas em pelo menos cinco dos últimos dez anos, ou que tenham beneficiado de uma dispensa lectiva por doença - possibilidade que não estava prevista nas anteriores propostas do ME.Deixa também de fazer parte dos requisitos a existência de um limite máximo de faltas para poder aceder à categoria de professor titular, uma vez que, à partida, nenhum candidato vai ser impedido de concorrer. No entanto, a assiduidade vai manter-se como um factor preponderante na selecção dos docentes.A proposta de revisão do Estatuto da Carreira Docente (ECD), apresentada ontem aos sindicatos, prevê ainda que os docentes possam beneficiar, a partir dos 60 anos, de uma redução da componente lectiva de oito horas por semana, ou seja, mais duas do que a tutela admitia nas anteriores versões do documento.Outra das propostas aceites pelo ME diz respeito à contagem do tempo de serviço para progressão na carreira dos professores titulares: a obtenção de um mestrado ou doutoramento vai representar uma bonificação de dois e um ano, respectivamente.Para Jorge Pedreira, secretário de Estado adjunto da Educação, este período de negociação suplementar da revisão do ECD terminou de forma positiva. "Avaliamos positivamente o processo de negociação, que contribuiu para melhorar a proposta e para nos aproximarmos das posições dos sindicatos, mantendo os princípios estruturais", afirmou, em declarações à agência Lusa."Respondemos às preocupações manifestadas pelos sindicatos, mas o processo negocial ficou hoje fechado. Foi uma negociação útil, séria, participada e produtiva, à qual se segue a fase de regulamentação", acrescentou Jorge Pedreira.No entanto, para José Nóbrega Ascenso, o processo "não teve a duração e as características de uma verdadeira negociação", até porque apenas houve discussão do articulado "a partir da penúltima reunião da negociação regular". Segundo o dirigente sindical, o calendário negocial também "foi imposto". Jorge Pedreira contrapõe a afirmação, garantindo que se realizaram "mais de cem horas de reuniões" e que, nos primeiros encontros, os sindicatos preferiram discutir "sistematicamente" questões como as duas carreiras, as quotas e as vagas, apesar de o Ministério ter esclarecido que essas eram questões das quais não abdicaria."Desenvolvemos um conjunto de alterações no sentido de nos aproximarmos das posições dos sindicatos nas matérias em que isso era possível. Os sindicatos reagiram positivamente mas consideraram as alterações sempre insuficientes", acrescentou o governante.Para o secretário de Estado adjunto e da Educação, o novo estatuto vai colocar os professores mais experientes e mais capazes a assegurar o trabalho de coordenação e organização das escolas e permitir uma efectiva diferenciação entre os docentes, identificando e premiando o mérito.No entanto, em comunicado, a Federação Nacional dos Professores (FENPROF) considera que a proposta do ECD apresentada pela tutela "é muito mais punitiva do que motivadora da classe docente". "Perante esta última versão do ME, a FENPROF reafirma o seu profundo desacordo com um estatuto que representa a negação da própria natureza da profissão docente e que introduzirá novos e relevantes focos de instabilidade nas escolas", refere a maior federação sindical de professores.Por seu lado, João Dias da Silva, secretário-geral da Federação Nacional dos Sindicatos da Educação (FNE), reafirma a ideia inicial de que o Ministério não cedeu perante as questões mais relevantes para os docentes."Continuamos a verificar um distanciamento insuperável porque o Ministério não abandonou as suas posições de princípio. Não houve espaço de aproximação naquilo que é estruturante do estatuto", afirmou o sindicalista.A plataforma sindical, que reúne 14 sindicatos do sector, realiza amanhã uma jornada de distribuição de comunicados à população e, na quinta-feira, reúne-se para começar a preparar a fase da regulamentação, assim como outras formas de luta, desenvolvendo iniciativas nos planos institucional e jurídico-constitucional.Em relação ao pedido de parecer jurídico, Nóbrega Ascenso revelou que, nas próximas semanas, deverão estar prontos pareceres de constitucionalistas contactados pelos sindicatos, e mostrou-se "convicto" na existência de irregularidades no documento proposto pelo ME, nomeadamente "relativas ao princípio da igualdade, princípio da expectativa e princípio da segurança e confiança jurídica".A divisão da carreira em duas categorias (professor e professor titular), a introdução de quotas para aceder à segunda e mais elevada e a avaliação de desempenho dependente de critérios como os resultados escolares e as taxas de abandono dos alunos separaram a tutela e os sindicatos."O produto final deste processo não é positivo nem para a escola, nem para o Ministério, nem para os professores. Todo o documento peca por defeito", concluiu o dirigente sindical.Além da jornada de protesto que decorreu na semana passada, com a realização de uma vigília de 49 horas frente ao ME e de um cordão humano, o novo ECD, que a tutela quer aplicar a partir de Janeiro, já motivou duas greves e duas manifestações nacionais, a última das quais a 5 de Outubro, Dia Mundial do Professor, que reuniu, em Lisboa, mais de 20 mil docentes.

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