quarta-feira, novembro 22, 2006


As dentadas dos professores

Alguns espantam-se com o facto da agenda reformista do Governo encher as ruas de todo o tipo de grupos sociais – professores, alunos, funcionários públicos, empregados dos correios, trabalhadores do metropolitano – sem que essa “instabilidade social” provoque danos visíveis nos índices de popularidade do primeiro ministro.

Pedro Marques Pereira

Se houvesse dúvidas em perceber o fenómeno, os senhores professores tiveram a amabilidade de as esclarecer, numa brilhante aula prática dada por toda a classe. O espírito de cooperação uniu professores de filosofia, mas também os de matemática, os de português, os de inglês e os de geografia. E de que se lembraram eles? De bloquear a capital durante várias horas, ao final do dia de sexta-feira.

Quem tenha, nesse dia, passado hora e meia para regressar ao trabalho depois de uma reunião fora, certamente rejubilaria se, no meio do trânsito, tivesse ouvido na telefonia o Governo anunciar o fim de mais um “direito adquirido” para os senhores professores. Tal como os próprios professores dificilmente controlariam um sorriso se, poucas semanas antes, enquanto esperavam mais de uma hora à chuva por um transporte alternativo ao metropolitano – que estava em greve – tivessem lido no jornal que o Governo pretendia cortar mais custos nos transportes públicos. E, certamente, mesmo muitos professores, aqueles que verdadeiramente dão o que têm, dia após dia, e se vêm ultrapassados pela direita pelos que apenas se preocupam em cumprir anos de serviço, apoiaram Sócrates se, nessa altura, tivessem recebido um telefonema de uma qualquer empresa de sondagens.

O paradoxo das novas batalhas sociais, e que os professores, os funcionários públicos, os trabalhadores do metro e a maioria das classes que têm saído à rua em protesto não percebem, é que para ganharem a guerra precisam que as suas lutas sejam entendidas pelo grosso da população. Pelos milhares de pessoas que praticamente não vêm os filhos – e foram obrigados a passar duas horas no trânsito para os ir buscar ao colégio – porque têm de cumprir objectivos para ter aumentos ou manter o emprego, e que financiam com os seus impostos as progressões automáticas na carreira e outros “direitos adquiridos”.

Não se condena aqui o direito à greve, ao protesto, à indignação, ao que quiserem. Mas enquanto insistirem em morder as mãos que os alimentam, os funcionários públicos – professores incluídos – estão condenados a reforçar o poder que pretendem fragilizar com os seus protestos.

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