segunda-feira, novembro 20, 2006

TLEBS


A língua materna
Não se pense que os professores de Português, porque é estes que estão em causa, não querem estudar, não querem “perder tempo ”a investigar uma área do conhecimento que tem tudo a ver com a sua área de especialização. Investigar até continua a ser, para a maioria deles, uma actividade complementar da sua função de docentes.
*Têm aparecido ultimamente vários artigos, alguns assinados por nomes conceituados na área das literaturas ou das linguísticas, uns mais científicos outros mais ligeiros, mas nenhum fugindo à ironia, uns roçando-a apenas, outros mergulhando fundo no gozo subtil de um tema que vem irritando os professores e baralhando os alunos. Estou-me a referir à já célebre TLEBS. Para quem não saiba: Terminologia Linguística do Ensino Básico e Secundário. Porquê irrita? Porquê baralha? Comecemos pela primeira questão. Não se pense que os professores de Português, porque é estes que estão em causa, não querem estudar, não querem “perder tempo ”a investigar uma área do conhecimento que tem tudo a ver com a sua área de especialização. Investigar até continua a ser, para a maioria deles, uma actividade complementar da sua função de docentes. Mas… os professores conhecem os seus alunos e sabem as limitações de muitos, se calhar da maior parte, no uso da língua mãe. Conhecem as suas dificuldades em interpretar, sabem como é reduzido o seu vocabulário, como são refractários à leitura, como a enorme maioria não consegue criar um texto coerente, cabalmente articulado e com um léxico variado e bem adequado. Por isso, e já há muito tempo que os professores de Português protestam contra os programas excessivos que não lhes permitem tempo para desenvolver nos alunos aquelas competências - que são de facto as prioritárias – por isso, dizia, estão irritados por terem agora de perder um tempo precioso a ensinar novas terminologias e sobretudo novos conceitos que a prática mostra não serem nem fáceis, nem inequívocos, nem sequer consensuais em muitos casos. Só para mostrar a complexidade da “ciência” que temos de impor aos alunos vejamos um exemplo. Se, ao fazer uma análise sintáctica, me quero certificar se estou diante de um complemento ou de um modificador, preciso, nos casos em que não é evidente, de empreender um ou vários dos seguintes testes: verificar a possibilidade ou a impossibilidade do respectivo segmento figurar numa pergunta do tipo “o que fez”, “o que aconteceu” “o que se passa com” ; substituir um verbo transitivo por um verbo intransitivo; colocar o grupo verbal em estrutura clivada. .O leitor ficou baralhado? Os alunos também. E está respondida a segunda questão.Eu não sei e se calhar muito pouca gente sabe a razão desta determinação ministerial da aplicação da TLEBS nos ensino básico e secundário, mas, por mim, penso que deve haver dente de coelho a trincar os neurónios dos meninos, meninos pequenos, meninos grandes. Meninos que deviam empregá-los, no que toca à disciplina de Português, a desenvolver a sua capacidade de comunicar, quer oralmente quer por escrito, de uma forma cada vez mais correcta, cada vez mais eficaz e, porque não, cada vez mais bonita. Que deviam sair da escola a dominar a sua própria língua, a ser capazes de tirar dela toda a riqueza que ela encerra. Que deveriam ter aprendido a usá-la para se poderem defender, para poderem argumentar, para poderem expor de forma clara um pensamento, uma ideia e até, por que não, para poderem dizer de forma harmoniosa um poema.
*Professora do Ensino Secundário
salvadormanuela@hotmail.com

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