terça-feira, outubro 10, 2006

Novas tecnologias na escola


As Novas Tecnologias e as Escolas

Em princípios de Janeiro de 1998, o Conselho Nacional da Educação organizou um interessante debate sobre as Novas Tecnologias de Informação e Comunicação (NTIC) e as escolas. As ideias apresentadas não eram novas, mas tiveram o mérito de sistematizar muitas das questões que as escolas hoje debatem. Só por isso os méritos foram grandes.
p Expansão
As NTIC estão nas escolas, toda a comunidade escolar as usa, dentro e fora delas. Basta utilizar o multibanco, ligar a TV por cabo, a internet, e até o telefone fixo ou móvel.
As escolas de forma mais ou menos lenta, vão acompanhando a expansão destes sistemas - redes, equipamentos, técnicas e práticas. Em termos de política educacional são ainda mal conhecidos os objectivos que estão a ser prosseguidos. Três parecem reunir largo consenso, nomeadamente no capítulo das exigências básicas: democratizar; promover a autonomia; familiarizar.
Democratizar. Apesar de todos os discursos sobre a promoção de oportunidades, as escolas tem-se revelado impotentes para combater as desigualdades sociais no acesso ao saber. Como mostrou André Petitat, novas desigualdades surgem quando outras desaparecem. Contudo este princípio de promoção da meritocracia mantém-se como uma obrigação social dos sistemas educativos modernos. Neste sentido é apontado como uma necessidades para a rápida expansão das NTIC na rede escolar, o facto das mesmas poderem servir para promover o acesso por parte dos jovens oriundos de famílias e estatutos socio-económicos mais desfavorecidos a uma sociedade de informação e comunicação, caso contrário assistiremos ao crescimento de uma nova categoria descriminados: os info-excluidos.
Promover a Autonomia. Não há manual nenhum sobre as novas pedagogias que não tenha à cabeça a questão da promoção da autonomia dos alunos no acesso ao saber. Para a maioria dos intervenientes trata-se de uma exigência, decorrente de uma constatação: as escolas já não são a principal fonte de saber. Aprende-se cada vez mais de forma autónoma e fora das escola. Aprende-se na TV, na imprensa, na Internet. Os alunos encaram agora a escola como uma fonte de informação entre muitas outras com origens indeterminadas. Instalou-se a ideia que é preciso autonomizar os alunos das escolas e dos professores, desfazendo velhos mitos: as primeiras como os centros por excelência de transmissão dos saberes, os segundos como aqueles que tudo sabem.
Familiarizar. As razões económicas são sempre decisivas na educação. Os analistas estão de acordo num ponto: a terciarização da economia é um facto. Os produtos estão a desmaterializarem-se. Os processos de trabalho e capital intensivos estão a ser rapidamente substituídos por outros baseados na informação e no conhecimento. Quanto maior é o desenvolvimento de um país, maior é o peso das NTIC. A competitividade das economias à escala mundial exige a rápida formação e familiaridade da sua população com estas tecnologias. Neste sentido é consensual aceitar que um dos objectivos para a expansão das NTIC nas escolas reside na função que as mesmas podem desempenhar de familiaridade os alunos na utilização das novas tecnologias e na proficiência das operações de processamento de informação e comunicação que as mesmas viabilizam. A exigências económicas assim o obrigam.
p Mudar as Escolas
As antigas fábricas estão a ser reduzidas a monumentos de arquelogia industrial, mas as escolas construídas à sua imagem e semelhança sobrevivem. Esta era outra das espantosas conclusões do mencionado debate. Andy Hargreaves diria ainda pior, isto é, as escolas como reacção à globalização estão a virarem-se para o seu interior, burocratizaram os seus modelos de funcionamento, quebraram as suas redes internas de informação, isolaram os seus protagonistas. Os participantes no debate acharam difícil compatibilizar as NTIC com os horários e a própria lógica de funcionamento das escolas no seu todo.
Perante este cenário reactivo às NTIC advoga-se a substituição da função tradicional das escolas. Em vez de fazerem da transmissão de saberes a sua principal missão, deveriam centrar-se na criação de contextos mais estimulantes e propiciadores para a aquisição de saberes e competências básicas para os alunos terem êxito numa sociedade de informação.
O que acima de tudo a escola tem que vencer é o fosso que a separa das novas fontes de saberes globais assentes em linguagens mais apelativas e uma enorme diversidade de temáticas. Atributos que a escola actual não consegue dar e provavelmente nunca o conseguirá.
p As Novas Funções dos Professores
Os professores vivem numa encruzilhada. Muitas acham até que vão acabar substituídos por computadores. Alguns chegaram a apelar para que os professores deixassem de assumir a posição, se é que ainda a têm, que são os detentores da verdade científica, técnica, humanística e artística, e adoptem uma atitude socrática: humildade perante a vastidão e a constante criação do saber. Quando se trata de definir as novas funções dos professores, sucedem-se as ideias do que estes devem ser:
Catalisadores da procura do conhecimento.
Gestores da informação
Mediadores entre o aluno e o mundo caótico da informação.
Auxiliadores na estruturação da diversidade das experiências.
Mestres no sentido socrático, isto é, partes activas na procura do saber, tendo como única certeza as limitações do seu próprio saber.
Facilitadores no acesso à informação, mas sobretudo, não se deve reduzir a meros transmissores de conhecimentos.
Volta-se em suma, à antiquíssima figura do professor como o companheiro mais velho, mas nem por isso menos exigente quanto a modo como se caminha na procura do saber.
p Implicações Filosóficas
As consequências das NTIC frequentemente reduzidas a problemas meramente económicos, tendo-se constatado que as mesmas estavam a diminuir os postos de trabalho, nomeadamente para os trabalhadores pouco qualificados. Outros procuram-nas integrar no tempo, pondo em evidência que a aceleração do ritmo da sua invenção e difusão, concluindo que estamos a entrar numa fase de grandes mutações tecnológicos.
Houve também quem pensasse que da história podemos retirar diversas ilações sobre a difusão das invenções, como a escrita alfabética, o códice, a imprensa, os jornais, a rádio, para já não falarmos da televisão. Todas elas eram em certo sentido novas ferramentas de comunicação, mas todas não deixaram de influenciar a maneira de pensar a própria realidade. Para quem pense que os computadores são uma mera ferramenta, cujas implicações se reduzem à introdução de novas práticas, aconselha-se que leiam Nell Postman. Em termos de consequências o tema do dia é todavia a Internet.
O comportamento dos cibernautas é descrito como estando afectado por o síndroma do "clic". Navegar na Internet tornou-se uma prática compulsiva que os leva a carregar o maior número de vezes no menor intervalo de tempo possível. É este o seu objectivo não procurarem saber mais.
Os conteúdos difundidos pela Internet estão também afectados pela cultura norte-americana do pronto-a-comer, são produtos feitos para empregados de escritório que não tem tempo para comer, ou simplesmente para aqueles que desconhecem e por isso não apreciam a arte da culinária.
Em termos mais radicais, há os que afirmam que não podemos continuar a confundir informação com conhecimento. O homem hoje está mergulhado em informação. Mais informação não é o seu problema, mas sim mais conhecimento.
No lado oposto, estão todos aqueles que afirmam que na Internet é sempre possível ampliar os conhecimentos. Há sempre uma página à espera com novos conhecimentos pronta a ser descoberta, basta saber onde clicar. Inventou-se aquilo que alguns filósofos, como Pierre Lévy chamam uma verdadeira inteligência colectiva. O tema merece uma nova reflexão. Até breve.
Carlos Fontes

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